Sexta-feira, 24 de Janeiro de 2014

Crônica da Urda - REVIVENDO 2

 

 

REVIVENDO 2
                                   (Para Eduardo Venera dos Santos Filho)
                                   Hoje, de novo, saí em busca do passado. Subi a pequena encosta que leva à Igreja Luterana segurando na mão o coração tremeluzente de densa saudade. Estivera lá em cima diversas vezes nas últimas décadas – afinal, sempre alguém se casa, ou morre, ou se batiza, e há os túmulos dos antepassados – mas sempre subi com os olhos e o coração fechados para a emoção, sempre passei de raspão, sem querer olhar, sem querer lembrar – mas hoje fui lá especialmente para ver.
                                   Fiz os cálculos: mais ou menos aqui se estacionava o carro. Ali embaixo era pasto, e quando chovia muito, ficava tudo inundado, e depois vinha o sol e naquela água parada se refletia o azul do céu e as nuvens vogando livres... E veio a lembrança da liberdade ali, lugar onde ninguém passava em dia de trabalho, abrigo certo e perfeito para quem estava tão, mas tão, mas tão apaixonado quanto nós. Era como se a ternura e o carinho não tivessem ido embora e pairassem por ali, em girândolas coloridas, e até agora, tarde da noite, ainda estou em dúvida se as girândolas estavam ou se foi só produto da minha imaginação.
                                   Desviando um pouquinho o olhar, tinha sido o campo de futebol, Palmeiras Esporte Clube, e entre uma coisa e outra, a rua estreita e tortuosa, a única que havia então. Tudo mudou; a rua se multiplicou em diversas pistas lotadas de carros em movimento, e já não há campo de futebol nem nada é mais como foi: a paisagem está suja de uma imensidade de prédios e prediozinhos, um deles de vidros tão espelhados que parece que nem existe, e a gente só o descobre porque espelha aquela paisagem borrada que parece ter nascido do sonho de um pintor louco.                                                    Tudo mudou mesmo: coisas como grandes supermercados enchem a base do morro, e a encosta, que tivera elegante fileira de azaleias que juntos vimos florir por toda uma primavera, agora está coalhada por aqueles arbustos e outras coisas, como moitas de taquaras.
Mais uma vez olhei para as árvores: qual delas estivera ali naquela época, qual nascera depois, haveria testemunhas dos tempos que amor tão grande ali vinha se abrigar à sombra da igreja? Uma placa indicou-me duas palmeiras que ali estavam desde o século XIX – portanto, havia testemunhos vivos daqueles tempos tão maravilhosos que até parece que foram só de sonho... Indagava-me que outras plantas de então estariam ainda vivas, e então apareceu o zelador do local e conversei com ele, que sabia com exatidão que aquela árvore tinha 27 anos e coisas assim – pude tirar uma medida de quem ali estivera naquele tempo do nosso tempo e, enquanto conversava com o zelador, cumprimentava silenciosamente as velhas testemunhas daqueles momentos que pensava que estavam perdidos lá no passado.
Foi então... Como então, o sino das seis da tarde começou a tocar, o mesmo sino lá das lonjuras do tempo, aquele sino que anunciava seu carro subindo outro morro para me buscar no serviço, aquele sino que ouvíamos ali... Eu mal podia crer que aquele sino ainda existia e continuava tocando, e cada badalada dele batia na minha alma como uma flecha, e de novo era primavera, as azaleias estavam floridas e você usava aquela camisa de tergal branco e eu podia me abrigar, de novo, junto ao seu peito, e sentir seu aroma bom de limpeza e de Pinho Campos do Jordão, do qual guardo um frasco faz mais de quarenta anos... Então, chorei, mesmo que o zelador achasse estranho. O amor é assim... Não há como explicar...
Blumenau, 10 de janeiro de 2014.
Urda Alice Klueger
Escritora   

 

publicado por o editor às 15:05
link | comentar | favorito
Terça-feira, 21 de Janeiro de 2014

Crônica da Urda - As Clarissas da minha vida.

 

 



As Clarissas da minha vida.
                                   Nem sei por onde começar. Talvez por um dia luminoso de março, meu primeiro dia de aula de português no primeiro ano ginasial, onde o bom e velho professor Trierweiler deu como tarefa de casa escrever uma redação chamada “Festa de aniversário”. Fui para casa, imaginei uma festa de aniversário num salão de chão rebrilhante, onde uma menina que aniversariava tocava um piano envernizado e se chamava Clarissa.  A minha redação redundou na maior bronca. Recebi-a de volta com um “zero” escrito em garrafais letras vermelhas e junto com a maior descompostura possível, dada pelo meu bom professor, que mais tarde se tornaria meu revisor. Por que a bronca? Porque o professor me acusava de ter copiado a redação de um livro de Érico Veríssimo.
                                   Nessa altura, eu ainda não sabia quem era Érico Veríssimo, e lembro como fiquei de pé, tremendo de indignação, a dizer que não copiara a redação de lugar algum. Clarissa fora simples coincidência. Diz o professor, até hoje, que resolveu prestar mais atenção em mim – por enquanto, tirou o zero, botou um dez.
                                   Claro que tratei logo de saber quem era Érico Veríssimo, e um atrás do outro li todos os seus livros, e fiquei fã incondicional. Digo sempre, mesmo, que ele foi um dos meus grandes mestres brasileiros, junto com Jorge Amado (Muitos outros também foram meus mestres, mas estrangeiros).
                                   Daí um dia, que acabo de descobrir agora que foi em 1975, eu estava viajando num carro de um amigo numa distante estrada, e deu no rádio do carro que Érico Veríssimo partira. Gente, como doeu! Eu não podia crer que uma pessoa que escrevia livros como “Clarissa”, ou “O tempo e o vento” não pudessem ser imortais. Doeu tanto quanto perder um tio, um pai. Meu mestre se fora irremediavelmente. Deixara-me Clarissa, porém, e todas as suas outras histórias.
                                   A vida correu. A vida às vezes toma rumos que a gente não espera. Um dia, uma das netas de Érico Veríssimo morou um ano em Moçambique, país onde tenho parte da minha família, e a minha gente ficou amiga dela, e da irmã dela, e da mãe dela, que lá tinham ido passar férias. Foi amizade mesmo, coisa assim de minha sobrinha ir para Paris e ficar hospedada na casa dos Veríssimos lá, e depois ir a Porto Alegre e fazer o mesmo – quando ela foi a Porto Alegre eu dizia: “Querida, por favor, me telefona de lá, eu quero pelo menos ouvir o som da casa dos Veríssimos!”. Ela não só me telefonou como me botou a falar com D. Mafalda, a viúva do meu ídolo, e D. Mafalda acabou por me mandar um livro do falecido marido com dedicatória dela. Eu quase que desmaiei de emoção!
                                   Então, na semana passada, o jornal trouxe uma matéria sobre os 90 anos da Dona Mafalda, com fotos dela e tudo. Fiquei olhando para o jornal como uma boba. – aquela mulher que o jornal contava  maravilhosa e que eu sabia que era estava ali, em fotografia, e numa segunda foto trazia no colo, junto com o marido, os filhos Luiz Fernando e... Clarissa! Daí descobri onde o meu grande mestre buscara o nome da sua heroína! Clarissa existia mesmo! Fiquei pensando se a menina lá do meu primeiro ano do Ginásio, a que tivera um aniversário a tocar um piano envernizado não poderia, talvez, ser aquela menina Clarissa  que vivia, de verdade, lá no Rio Grande do Sul!
                                   Sei que descobri que tenho três Clarissas: a que fez o professor me dar a bronca, a heroína dos livros do meu grande mestre, e uma menina que já deve ser mulher madura, e que mora, segundo o jornal, nos Estados Unidos.
                                   Parabéns, querida D. Mafalda! Obrigada por ter me dado mais uma Clarissa!
                                               Urda Alice Klueger
                                               Escritora, historiadora e doutoranda em Geografia pela UFPR.
                                               Blumenau, 19 de Junho de 2003.

 

publicado por o editor às 12:04
link | comentar | favorito
Terça-feira, 7 de Julho de 2009

Todas As Guerras


Todas As Guerras, V.1 - Tempos Modernos

VARIOS AUTORES
Organizador: NELSON DE OLIVEIRA

No dia 04/07 ocorreru o lançamento da coletânea TODAS AS GUERRAS (Editora Bertrand Brasil), coletânea de contos organizada e editada por Nelson de Oliveira na OFF FLIP - Circuito Paralelo de Ideias, em Paraty - RJ

Neste livro, cada uma das principais guerras da humanidade é abordada pela narrativa de um autor diferente. São contos de ficção de diversos gêneros, incluindo ficção especulativa e fantástica.

O livro começa com um cerco nas Cruzadas e fecha com a guerra no Oriente Médio. Mais do que uma lógica cronológica, o livro traz um olhar crítico sobre momentos importantes da humanidade, todos marcantes na vida de diversas gerações.



UM LANÇAMENTO



publicado por o editor às 11:59
link | comentar | favorito

.tags

. todas as tags

.arquivos

. Janeiro 2017

. Dezembro 2016

. Novembro 2016

. Outubro 2016

. Setembro 2016

. Agosto 2016

. Julho 2016

. Junho 2016

. Maio 2016

. Abril 2016

. Março 2016

. Fevereiro 2016

. Janeiro 2016

. Dezembro 2015

. Novembro 2015

. Outubro 2015

. Setembro 2015

. Agosto 2015

. Julho 2015

. Junho 2015

. Maio 2015

. Abril 2015

. Março 2015

. Fevereiro 2015

. Janeiro 2015

. Dezembro 2014

. Novembro 2014

. Outubro 2014

. Setembro 2014

. Agosto 2014

. Julho 2014

. Junho 2014

. Maio 2014

. Abril 2014

. Março 2014

. Fevereiro 2014

. Janeiro 2014

. Dezembro 2013

. Novembro 2013

. Outubro 2013

. Setembro 2013

. Agosto 2013

. Julho 2013

. Junho 2013

. Maio 2013

. Abril 2013

. Março 2013

. Fevereiro 2013

. Janeiro 2013

. Dezembro 2012

. Novembro 2012

. Outubro 2012

. Setembro 2012

. Agosto 2012

. Julho 2012

. Junho 2012

. Maio 2012

. Abril 2012

. Março 2012

. Fevereiro 2012

. Janeiro 2012

. Dezembro 2011

. Novembro 2011

. Outubro 2011

. Setembro 2011

. Agosto 2011

. Julho 2011

. Junho 2011

. Maio 2011

. Abril 2011

. Março 2011

. Fevereiro 2011

. Janeiro 2011

. Dezembro 2010

. Novembro 2010

. Outubro 2010

. Setembro 2010

. Agosto 2010

. Julho 2010

. Junho 2010

. Maio 2010

. Abril 2010

. Março 2010

. Fevereiro 2010

. Janeiro 2010

. Dezembro 2009

. Novembro 2009

. Outubro 2009

. Setembro 2009

. Agosto 2009

. Julho 2009

. Junho 2009

. Maio 2009

. Abril 2009

. Março 2009

. Fevereiro 2009

. Janeiro 2009

. Dezembro 2008

. Novembro 2008

. Outubro 2008

. Setembro 2008

. Agosto 2008

. Julho 2008

. Junho 2008

. Maio 2008

. Abril 2008

. Março 2008

. Fevereiro 2008

. Janeiro 2008

. Dezembro 2007

. Novembro 2007

.subscrever feeds

Em destaque no SAPO Blogs
pub